domingo, janeiro 29, 2006

Abandono

Desculpa!
Fiz questão de te confundir com uma pessoa por quem me reconhecia.
Desculpa!
Fiz de propósito quando o aço da minha mão transformou a tua testa em alvo imperfeito.
Desculpa!
Fiz de conta que não via, enquanto destruía um olhar que parecia não querer existir.
Fez tanto frio ontem nos meus braços…ninguém fez disso notícia. Caiu a alma no chão, sem aparente amparo, congelou o lado esquerdo do meu cérebro e estratificou uma ordem sem tom, nas pautas de um surdo.
Dualismo cartesiano…o teu corpo e a minha mente! Separadas por um fino fio fictício numa noite sem faltas reais!
Desenhavas porque ninguém entenderia o que contavas no desenho que se pintava às escuras num quadrado cheio de fumo…Não conseguia respirar e a escuridão dissolviasse nos pulmões…uma noite para ficar confuso…sem influência dos astros, sem guia turístico, numa língua que é proibido falar entre nós, num teatro ao qual se reserva direito de admição. Era preciso um mapa sem coordenadas…era obrigatório nascer em gerações distantes. Obrigatório uma construção binária: Existes ou não existes!Sendo que na frase existe sempre o mesmo existe.
Reservo o direito de me desculpar pelas desculpas inventadas ao longo do tempo…e porque respiro o ar saturado da densidade da tua existência.
O abandono! O sentido mora o dia todo numa escuridão virtuosa, parece não saber que erra todo o caminho feito até aqui. Parece fazer de propósito só para não ter que pensar!
Ignoro-me, ignoro o mundo, ignoro o que me asfixia. Ignoro que as manhãs são submersas e ao longo do rio se constrói um rasto de saudade por aquilo que confundi em ti.
Desculpa porque fiz questão de imaginar por dentro dos meus ossos uma transparência de palavras que nunca poderias entender. Ignóbil ser!


dimensaooculta

terça-feira, janeiro 24, 2006

Nuvem...

















Não queiras pôr a nuvem numa caixa transparente,
Ensinar-lhe as leis quotidianas,
Com quanto amor domesticá-la.
Ela não fala essa linguagem.
Não tem lei, nem morada.
Uma secreta voz constantemente a chama.
Amá-la é conservá-la aí…
Nessa paragem, de instável insegurança.
E se quiseres guardá-la,
Na doce paz tão comum,
Tão diferente da paz inquieta, e sempre outro em que cintila.
Já não é a nuvem que tu amas, e mal sujeita ao clima estranho que a mutila, desfaz-se em água, e some-se na terra, transformada em lama.

Mário Dionísio



dimensaooculta

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Sentir

Queria não ter que sentir...Não ter que ter saudades de casa ou saudades de uma outra coisa qualquer...Não queria gostar mais de massa do que de arroz, não queria ter que gostar de nenhum tipo de comida. Não queria sentir frio, assim como não queria sentir calor. Não queria sequer ter que gostar mais de ler do que escrever...Não queria ter que gostar do verão ou do Inverno. Não queria não gostar de mim ou não gostar de gostar de mim. Não queria ter que gostar de ti.Não queria sentir...Ausência total de emoções...Não queria sentir as minhas lágrimas nem o sorriso quando me lembro de alguns momentos.
Apatia inerte do meu pensamento...Não queria ver-te chegar, não queria sentir que vais embora...Não queria sentir a certeza de que não sou mais do que que aquilo que quero ser.
Lembro-me tarde e sempre com muitas incertezas e embora me consiga rir, hoje só me apetece chorar porque sou obrigada a sentir...Porque só sinto este grito apertado dentro da alma das palavras que não digo e só me apetece partir as janelas, as paredes e os móveis pela raiva toda que guardei porque não quero sentir...e corro...tanto que não me apercebo do caminho, e escrevo, penso, levo as mãos à cara, fecho os olhos, gesticulo, mexo, escondo, atiro folhas, retiro cores...tudo porque te sinto até à exaustão...até não restar um único laço, nenhuma ponta por onde se lhe pegue...
Hoje sou só eu com os fantasmas...só eu com tudo o que não quis para mim...com tudo mais que consigo imaginar.
Não me ofendo...morro em falsas estruturas com muita febre!


dimensaooculta

terça-feira, janeiro 17, 2006

Uma canção portuguesa vinda de Itália

Um texto enviado pelo nosso discepolo italiano...porque o brilho das crianças portuguesas vive muito para além das nossas fronteiras. Fica-se a aguardar a versão original da canção. Entretanto aqui fica a tradução possível.

A canção da criança portuguesa

E então, e então,
as pessoas vêm aqui e dizem -lhe
Já saber todas leis das coisas
E todos, você sabe, ostentam um orgulho cego
de verdades feitas de fórmulas vazias
E todos, você sabe, o conhecem dizer como fazer,
Que leis para respeitar,
que regras para observar,
O que a verdadeira verdade é,
E então, e então,
todo o mundo fechou em tantas celas,
age a quem fala mais forte
para não dizer que estrelas e a morte amedrontam.


Para o sol quente e para o mar seguiu
a criança portuguesa
Não havia nenhuma palavra, barulhos só
como expressas surpresas.
O mar só,
e o primeiro amaranto de biquíni dela,
As coisas mais bonitas
e a alegria do calor em cima da pele.


Os próximos amigos pareciam submersos
com a voz do mar;
Ou em sonhos ou em visões algo a levou
e começou a pensar;
sentia que era um ponto
para o limite de um continente,
ela sentia que era um nada,
o imenso Atlântico em frente.


Nisto sentia
algo grande que
não foi capaz de entender,
não pôde perceber;
O que ela teria explicado,
se ela tivesse entendido isto,
e o oceano infinito;
Mas o calor a feriu
e sentia - se desvanecer e começou a dormir
E só era para o sol,
como de mãos futuras.
Só ficaram
o mar e um amaranto de biquíni.


E então e então,
se você se descobre se lembrar,
perceberá
que nada o preocupa.
E você entenderá
isso que numa noite ou numa estação
é como raios,
aceso luzes e depois de fora.


E você entenderá
que a verdadeira ambiguidade
é a vida que nós vivemos,
o algo a que nós chamamos ser homens ,
E então, e então,
aquele vício que nos matará
não será fumar ou beber,
mas o algo dentro do que você traz,
Isso é viver, viver.
E então, então viver.

Francesco Guccini

Grazie Erasmo

domingo, janeiro 15, 2006

Embrião...

Sou ainda embrião.
O meu corpo vai crescendo,
espreito pelo buraco do pequeno aquário,
estou protegida, sem medo de me afugar.
Fazem-me festinhas, cafunés...
Vou crescendo....
Humm!!! É Bom!!a voz do aquário diz-me que vou ser feliz quando descobrir
que o mundo é mundo,
que a água é incolor,
que o céu é azul e oferece-nos todas as noites presentes
porque candeeiros acendem e iluminam esse "nosso" espaço.
que gente de duas pernas e dois braços transforma-se com o acender dos candeeiros,
Verdades são verdades,
instinto é instinto.

A vozinha continua a dizer-me que:
as borboletas têm muitas cores
que fogo é calor e pode queimar,
que as sensações são boas,
que amor e romA são a mesma coisa,
que um abraço é a fusão de amor sem sexo,
que um murro doi mas pode trazer um sorriso.
que respirar apesar de nos envelhecer, é bom!

Depois do grito... o sol brilha, os pássaros cantam, as galinhas da índia estão cada vez mais bonitas.
As plantas mudam de cor e sorriem.
A lua estende-me a mão e dá-me um abraço,
O vento sopra
a nuvem escorrega e tapa-me, aconchega-me à lua.
Respiro!!! Fecho os olhos e adormeço abraçada à lua.
Uma voz sussura-me ao ouvido:
- Dorme bem, minha pequenina!...

Os relógios não param e o mundo continua em movimento.
Corro freneticamente em busca de um tempo, sem tempo,
os sonhos tornam-se verdadeiras realidades,
mas continuo a ter prazer em sonhar.

Na estrada, de partida, descobrimos que:
Estou bem onde não estou,
só quero ir onde não vou.
As linhas continuas cruzam-se e guiam-me,
descubro que viajar faz bem!

Poderei ser um vagabundo,
mas serei eu dentro de mim.
SER FELIZ, SER POSITIVA, SER SIMPLESMENTE O QUE ME APETECE.
Serei musica, amor, paixão, romance e..... reticências.
Serei alma num corpo de embrião.


Um abraço para todos aqueles que fazem parte da minha vida,
e um obrigada!

Até amanhã gente bonita,

Dulce

sábado, janeiro 14, 2006

Pele

"Vamos escrever poemas da pele na pele!?"
Lembrava-se de cada coisa...
Acho que nunca lhe disse que a fazia rir...ficou tanta coisa por dizer!
Se pudesse não sentir tinha pedido para ele ficar...apenas para ficar!

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Havia um quarto!
Havia uma porta num quarto;
Uma mulher à porta de um quarto,
Um homem abraçado a uma mulher à porta de um quarto!
O tempo esquecido do homem abraçado a uma mulher à porta de um quarto!
Procura-te ainda hoje já sem esperança, nesse quarto com uma porta para o Mar, onde a abraçarias no tempo que esqueceste.

dimensaooculta

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Doce loucura, será?

Hoje, terça feira, noite de meia lua mas com sabor a queijo.
Reparei que no céu está uma estrela incrivelmente mais brilhante que as outras. A música que preenche os recantos do meu quarto transforma-se numa forte vibração e direcciona-me para a estrelinha mais luminosa do céu. As notas do piano estão cada vez mais fortes, têm ritmo e uma melodia demasiado energetica que me impulsiona para a estrela. Dirijo-me para lá como um foguetão em busca do espaço....!... meu deus é linda a vista daqui de cima!

Passo por entre pedaços de algodão. Tenho que parar por breves momentos, preciso de apreciar tudo, quero guardar esta imagem aqui dentro, bem quentinho, quero saltar no algodão e sentir a leveza de uma alma "comsem" corpo.

Bem, a estrelinha chama-me... a melodia do piano volta a entrar em extase. Estou perto! Falta pouco. Está demasiada Luz... não vejo nada!!! Bolisco o meu corpo para me sentir. Estranho!!! Já Não tenho corpo.
- CORPO, ONDE ESTÁS?? VOLTA PARA AQUI, TU PERTENCES-ME? O piano deixa de se ouvir, agora só estou eu e a luzinha. O corpo deixou-me mas é este o caminho, não vale a pena olhar para trás. A luz deixa de ser luz para passar a ser tudo... deito-me e fico a contemplar as vistas para a bonita esfera que temos debaixo dos nossos pés.

Até amanhã doce loucura!

Dulce

terça-feira, janeiro 10, 2006

....romA?


.... Poderá ser romA uma parte de um todo conhecido repleto de algo profundamente desconhecido? Grande dicotomia não?! como será isso? Será que conhecemos os cantos todos da nossa casa? Há sempre um belo borboto por descobrir naquele canto esquecido. Uma sombra por explorar. Será que conhecemos todos a palavra roma? Tenho dificuldades em traduzi-la. "Pense" diz o grande Simon Blackburn. Pois eu digo que nem tu chegaste lá!

Questiono-me vezes sem conta sobre o significado dessa palavra cheia de história e de vida. Ou mesmo das palavras que constituem o nosso dicionário. Penso em cada uma delas... MEU DEUS!!! SIGNIFICADO?

ROMA pode ser o que quisermos depende do ponto de vista. será o nome de uma cidade? ou será uma palavra cheia de sentimento que o Homem tenta construir e construir, restaurar, mimar, energizar.... é bonito sentir tudo isso; na realidade andamos aqui por causa dessa linda palavra romA.

Um dia quando for velha e me sentar no muro a contemplar o fim da tarde no rio quero fechar os olhos, ouvir os peixes a saltarem na água e as gaivotas a salivarem-se por mais uma refeição, Ouvir o filho a fugir da mãe pedindo um pouco de atenção, miminho e autonomia, ouvir um sorriso e sentir o calor de duas pessoas que se amam, quero pegar no pedaço de ser que rege o meu próprio movimento, tirá-lo de mim, olhá-lo de frente e dar-lhe um beijo com sabor a romã.

Termino o dia numa igreja com "ar saudavél" a sorrir com embaraço, e a dizer "Bem hajas!". Abraçar-me (te) e dizer, "afinal a tua alma é levezinha, nunca pensei conseguir pegar em ti". Obrigada! Afinal vale a pena ser todos dias romA.

Um abraço cheia de sons de uma Ode,
Até amanhã!

Dulce

domingo, janeiro 08, 2006

Gesto

Eu fico quando tudo o resto foi esquecido nas luzes mornas dos candeeiros, por entre um nevoeiro amarelo. Estão oito pessoas na mesa e todos se preocupam mais em ser ouvidos do que em ouvir. Discutem sem chegar a conclusão nenhuma, discutem sem saber o que estão a discutir, falam sem saber o que estão a escutar. Ensaiam defeitos e não decoram as soluções. Grito da minha cadeira e ninguém me ouve, choro da minha cadeira e ninguém vê…morro da minha cadeira e ninguém chora. Não sabes que não estamos a brincar?! Não sabes que basta apanhar uma luz para tudo ficar melhor?! Venho embora sem saber porque fiquei…a discussão continua inútil, infinitamente infértil. A rua lá fora parece gelada com as pessoas coladas na parede, com os passeios perdidos na madrugada que se inspiram pelas estátuas dos jardins. Venho embora sem desculpa, embora sem conteúdo, embora sem as malas, embora sem uma palavra, sem história, sem mim que fiquei na beira da estrada à espera que o sinal ficasse verde. Sozinha com as roupas geladas, com os passos incertos e os movimentos lentos. Parece que o cão vai morrer por atravessar a estrada para vir ter comigo. Invariavelmente todos acabam por fazê-lo. Eu esperei que ficasse verde sem saber porque…alguém me sussurrou qualquer coisa do jardim…fiz de conta que não sentia! Demasiadas vezes faço de conta…tantas que já perdi a conta ás vezes que julgava sentir! Tentar explicar isto? Numa conversa esforçam-se por se fazerem compreender em vez de compreender…deixo de insistir! Até porque amanhã já esqueci!
Apetece bolo de chocolate numa sala quente com pessoas que inspiram, mas a casa está vazia, glacial e o único chocolate foi aquele que não sobrou da época festiva. Resta-me imaginar.
Adormeço a saber que me resta muito pouco tempo e que o tenho desperdiçado em coisas que não me dizem nada, acordo com dores de olhos, com as palavras acorrentadas ao chão de lama, com as mãos fechadas ao vento, com o corpo irreal, com a alma descerrada.
Não era isso que queria dizer! Não era de todo isso que queria sentir! Não é isso que dói!
Adormeço outra vez…Amanhã esqueço!

dimensaooculta