domingo, julho 29, 2007

The Kiss - Edvard Munch

"...E há palavras e nocturnas palavras gemidos
Palavras que nos sobem ilegíveis
À boca
Palavras diamantes palavras nunca escritas
Palavras impossíveis de escrever
Por não termos connosco cordas de violinos
Nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
E os braços dos amantes escrevem muito alto
Muito além da azul onde oxidados morrem
Palavras maternais só sombra só soluço
Só espasmos só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
E entre nós e as palavras,
o nosso dever falar."
Mário Cesariny
Ao longo da muralha

sábado, julho 14, 2007

Rabih e Ricardo


Há surpresa. Pela forma como me arrepiei ontem com aquela voz, com a entrega de Jarrod Cagwin, com as reverberações do alaúde de Rabih. Sorri mais do que seria de esperar, assustei-me e gostei. Entreguei-me e soube bem. À surpresa juntaram-se porventura os copos à hora do lanche, os cigarros deixados pelo caminho e aquela amargura de teres regressado novamente.
Voltas sempre quando a tua figura parece diluída. Eras recordações, nada mais. Ontem voltaste a ser o olhar fugidio, hoje o discurso desconexo. Tudo tão teu, por vezes tão nosso.

Foste ver o mar, eu devo ir agora apanhar o pôr-do-sol...ao rio.

quarta-feira, julho 11, 2007

Rascunho


O instantâneo assemelha-se ao rascunho. O molde eficaz, o imediatismo, a facilidade das soluções... Mas, tal como o rascunho, não passa de um projecto imediato na busca de melhores dias.

Hoje olho para mim e vejo um rascunho, um amontoado de projectos em lista de espera. As viagens que não fiz, todos aqueles que não amei, o que deveria ter sido nos dias que nunca aconteceram. As indefinições são perfeitas para quem tem certezas, trágicas para aqueles que esperam.

O sol podia ser uma boa desculpa para ser feliz, não fosse a ameaça dos dias de chuva. As estações sempre empacotaram bem o mundo. Há dias de praia, o refúgio da lareira, as folhas presas na relva, as flores que brotam da terra. Quando os dias de praia não chegam e as ameixoeiras dão fruto em Fevereiro há esperança. O desejo de escapar aos determinismos, a vontade de deixar para trás o que já não nos preenche sem que a solidão nos aprisione. Às vezes presa, outras livre demais para pensar no que já foi, a vida surge. Há dias em que apetece abraçá-la, outros em que só dois braços fariam a diferença.

Vou para casa com as mesmas certezas com que de lá sai esta manhã. Que a vida está cheia de paragens até ao destino final.