quinta-feira, março 19, 2009

A Luxúria


O denominado Atelier de Escrita chegou ao fim.
A mim soube-me a elixir anti preguiça. Houve palavras novas que me brotaram das mãos, novos sentidos para vocábulos outrora desconexos, houve descoberta. Ficou no fim a vontade. De mais. Escrever mais, ler mais, sonhar acordado em dias de sol. Valeu pela provocação do mentor à força.

Agora que a noite cai avassaladora, olho para o sucedido há poucas horas atrás e um sentimento de estranheza continua a percorrer-me o corpo. Já me despedi muitas vezes. Nunca de uma forma tão brutal. Foi um adeus. Definitivo. Com tantas palavras escritas ao longos dos encontros de quarta-feira, jamais pensei que tudo terminaria num trágico final de quinquilharia alarve. Eventualmente, o material desta noite poderá resultar numa bela comédia negra. Para mim fica o sabor a derrota. Como a História nos conta, é-se livre no papel. De facto, a liberdade acaba mal a boca se desprende. Uma liberdade que, só por esta noite, teve um valor concreto. Preço de tabela: 30 euros por cabeça.

Saí desapontada. Há tantos encontros que se lêem nos livros, quando cá fora nos perdemos quase sempre em esquinas bem iluminadas. Fico triste por me ter sido reservado o papel de vilão num enredo que nunca foi meu. Dói-me pensar que a vida é pouco mais que isto. Não querer voltar a um sítio que nos deixou agitar as asas, só porque aquela deixou de ser terra onde me queira demorar.

quarta-feira, março 11, 2009

Para ti (e com muito Cuidadinho...)


Li hoje a palavra "desabitada" para definir este pequeno espaço onde escrevo e me deito por vezes.
Tenho-me deixado estendida ao comprido, a ouvir o suave rumor das ondas e já não te atiro palavras ora furiosas, ora tão ponderadas como uma lista de compras.

Magoa-me este abandono, porque todos os dias sinto tanta coisa para te colorir. Às vezes meros 'flashes', outras parágrafos inteiros de ideias desconexas. Sento-me na cama ao som da aparelhagem antiga do Manel, a sentir o vento que sopra lá de fora, da minha nova rua, e quero deixar-te, Cuidadinho, algumas das histórias que tenho escrito para cerca de 20 meros rostos. Quero impregná-las em ti , para que as minhas palavras sejam também tuas.

(as ausências não são abandonos, são tão simplesmente férias grandes)

Este texto partiu de uma proposta concreta: "HUMILDADE"
As páginas contorciam-se ao ritmo da ondulação maquinal dos seus dedos. A respiração era pausada, a sombra movia-se de soslaio, o olhar, esse, impenetrável. Teciam-se algumas considerações acerca dos seus gostos literários, mas nunca se chegou sequer perto de um perfil psicológico. Houve quem garantisse que o funcionalismo público caído em desgraça de Gógol lhe assentava que nem uma luva. Outras vozes erguiam um espírito mais incauto, preso ao realismo mágico sul-americano. “Humilde: adjectivo de quem tem ou aparenta humildade; modesto; simples; obscuro; pobre; medíocre; respeitoso; acatador. Substantivo feminino da virtude que nos dá o sentimento da nossa fraqueza; modéstia; submissão ou inferioridade”. O dicionário vende certezas. Um momento passa a ser o tempo necessário para se dar significado. Não se complica, não se fazem avaliações subjectivas. Consulta-se. O homem, à luz do dicionário, cumpre-se como um exercício matemático. De palavras somadas, adjectivos subtraídos e desejos divididos em múltiplas interjeições. A ele agradava-lhe esta leitura alfanumérica. Subtrai o remorso na hora de premir o gatilho. Ainda hoje recorda a sua primeira vez, que dispensou qualquer ritual iniciático. O elevador seguia lento. 7h45. Edifício em auto-gestão e a neura impermeável dos dias de névoa densa. A vítima entrou no segundo piso. Um homenzinho de ar burlesco, acentuado pelo chapéu de coco enfiado entre as orelhas sobredimensionadas. Repugnante. -“Desculpe, vai para que piso?” Pergunta perfeitamente dispensável. De onde vem esta necessidade de perdão sem dolo? Não houve sequer tempo de lhe sentir o cheiro gasto do sobretudo castanho caído em desuso. O revólver disparou uma bala certeira. Ninguém ouviu. A uma primeira morte abafada segue-se um exemplo destemido. O gatilho não tardou a manifestar-se. Dias depois, numa terça-feira agitada a tresandar a véspera de ano novo, a ira embarcou no 501. As feições acentuadas e a robustez impressa no olhar desvaneciam-se sempre que entrava um “espécime de fato e gravata”. Estaria porventura perto de completar meio século, mas as ruas contraiam-se na ânsia de ceder o lugar perante a mais ligeira possibilidade de grau académico. A delegação de lugar sentado assemelhava-se a um rito de obediência medieval. Irritado, saiu na sua paragem e abandonou o rasto de gorduras saturadas e colesterol que desfilava entre os passageiros, substância completamente indiferente ao preço e à qualidade dos respectivos curtumes. Seguiram-se o caça multas da rua do Rosário, a caixa de supermercado crente na bondade da Nossa Senhora das Dores… Hoje, antes de entrar em casa, não suportou os lamentos quotidianos da dona do quiosque. O sangue colou-se aos tumultos na Grécia das primeiras páginas. À ebulição popular, o ‘serial killer’ de almas humildes responde com o desígnio da vontade. Riscar uma só palavra do dicionário, abafar o adjectivo e degolar o substantivo. A humildade é mero equívoco de pontuação.

domingo, janeiro 18, 2009


A Time fez elegeu as melhores 10 fotos de 2008.
O meu olhar envolveu-se com a mãe afegã, que alimenta o seu filho recém-nascido na remota província de Badakhshan, onde se regista a maior taxa de mortalidade materna no mundo. Abdica-se do ar para dar de respirar aos outros.
Na fronteira dos EUA com o México já há muito que a dádiva se esgotou. Hoje só muros se erguem, esboçando uma linha que, vista de longe, parece um traço singelo no deserto largo. Uma fortificação que, tal como uma ratoeira, protege os homens dos ratos.

domingo, janeiro 04, 2009

Ainda há vadios!

Ao ritmo dos 'rockets'

A história de um soldado em busca de memórias da guerra do Líbano. Há derrota, morte, há David Bowie, olhares que ficam para sempre, há corpos quentes de desejo e há cervejas. É uma guerra revisitada pelas memórias fragmentadas de um homem que sobreviveu esquecendo.

O assombro do olhar dos adolescentes, o vermelho do sangue e a fome de matar revêem-se no ecrã, numa altura em que outros olhares parecem contar uma história marcada pelos mesmos tons do sangue e da morte na Faixa de Gaza.

Ninguém aprende com estórias ou com a História. A Valsa com Bashir não é nenhum documento de purga pessoal, é "gente animada" que nos faz querer acreditar em mais do que meras máquinas de guerra.

GAZA: "Choque e pavor"

Sábado, dia 27 de Dezembro, a aviação israelita fez raides assassinos contra Gaza. De acordo com as autoridades israelitas, os lugares visados eram centros de comando do Hamas e das suas forças armadas. O balanço deste dia eleva-se a mais de 270 mortos e várias centenas de feridos. Numerosos civis foram atingidos, como relata o correspondente do The New York Times em Gaza, Taghreed El-Khodary («Israeli Attack Kills Scores Across Gaza»):

«No hospital de Shifa, numerosos corpos jaziam na morgue, esperando que a sua família os viesse identificar. Muitos estavam desmembrados. No interior, a família de um bebé de cinco meses que tinha sido gravemente ferido na cabeça por um rebentamento de obus. Com o hospital sobrelotado, o seu pessoal parecia incapaz de prestar ajuda. Na esquadra de polícia de Gaza, pelo menos quinze agentes de trânsito que estavam a treinar foram mortos. Tamer Kahruf, 24 anos, um civil que trabalhava numa obra de construção civil em Jabaliya, no Norte de Gaza, explica que os seus dois irmãos e o seu tio foram mortos sob os seus olhos quando a aviação israelita bombardeou um posto de segurança nos arredores. Kahruf está ferido e sangra da cabeça.»

Vítima desde há várias semanas de um bloqueio total, Gaza (e os seus médicos, evidentemente) está impossibilitada de cuidar dos feridos em condições normais.

O sítio Internet Free Gaza recolheu numerosos testemunhos de estrangeiros e de palestinianos no terreno que dão uma ideia da dimensão dos ataques.

O Hamas ripostou disparando várias dezenas de mísseis sobre Israel. Um israelita foi morto e vários foram feridos em Netivot e Ashkelon.

No domingo, dia 28, de manhã, as agências de imprensa anunciavam que o exército israelita estava a concentrar as suas tropas terrestres à volta de Gaza. Os bombardeamentos tinham sido retomados, tendo os raides israelitas atingido desta vez, designadamente, uma mesquita e uma estação de televisão. De acordo com o ministro da Defesa Ehud Barack, em caso algum punham a hipótese de um cessar-fogo: «É necessário mudar as regras do jogo»Israel resumes Gaza bombardment », Al-Jazeera English, 28 de Dezembro).

Na sexta-feira, Israel tinha excepcionalmente reaberto três pontos de passagem e deixado passar várias dezenas de camiões. Segundo um comentador israelita que defende o ponto de vista do seu governo, esta abertura fazia parte de actos de «diversão e de camuflagem adoptados pelo governo nos últimos dias» para apanhar o Hamas de surpresa. A escolha de um dia de sabat também. O mesmo comentador, Ron Ben-Yishal, explicou a 27 de Dezembro no sítio Internet a estratégia israelita: «Shock Tretment in Gaza».

«O que começou em Gaza no sábado de manhã é aparentemente uma acção limitada, visando obter um cessar-fogo a longo prazo entre o Hamas e Israel, em termos favoráveis a Israel. Estes termos incluiriam o fim dos ataques com morteiros e mísseis; o fim dos ataques terroristas através da fronteira de Gaza; negociações séria para a libertação de Gilad Shalit; e a suspensão do reforço militar do Hamas. O meio para garantir os objectivos mencionados é, literalmente, um “tratamento de choque”. Assim, o Hamas já não será capaz de tomar a iniciativa, e será Israel que tomará a iniciativa e mostrará ao Hamas que vai responder de forma “desproporcionada” de cada vez que os habitantes do Negev Ocidental forem bombardeados. Nesta fase, não falaremos do derrube do regime do Hamas, mas sobretudo da formulação de novas regras do jogo e de um esforço para pressionar o Hamas a aceitar um novo cessar-fogo.»

No sítio Internet do diário Haaretz, Amos Harel assinou um comentário intitulado «IAF strike on Gaza is Israel’s version of ‘shock and awe’».

«Os acontecimentos ao longo da frente Sul que começaram sábado de manhã, às 11h30, parecem-se muito com uma guerra entre Israel e o Hamas. É difícil dizer onde (geograficamente) e por quanto tempo vai prosseguir a violência antes de uma intervenção da comunidade internacional com vista à suspensão das hostilidades. Todavia, a salva de abertura israelita não é uma operação “cirúrgica” ou um ataque limitado. É o assalto mais violente a Gaza desde que este território foi conquistado em 1967.»

Esta ofensiva coloca-se também no quadro, se assim se pode dizer, da campanha eleitoral israelita. No dia 10 de Fevereiro de 2009 terão lugar eleições gerais e cada um dos candidatos faz apostas ousadas. Mesmo o partido de esquerda Meretz apelou, antes do desencadeamento do ataque israelita, a uma acção armada [1]. Em contrapartida, o Gush Shalom, a organização de Uri Avnery, condenou firmemente a acção israelita e os ditos apoiantes da paz, como Amos Oz, que a apoiam. Lembremos que em Fevereiro de 1996, o primeiro-ministro de então, Shimon Peres, tinha lançado uma ofensiva contra o Líbano («Uvas da cólera») – que ficou célebre pelo massacre de Cana, com uma centena de refugiados mortos – na esperança de ganhar as eleições que se preparavam. Resultado: Benyamin Netanyahu ganhou e tornou-se primeiro-ministro. No sábado à noite, um milhar de pessoas manifestou-se em Telavive contra os ataques israelitas.

É interessante notar que os comentadores israelitas, como a maior parte dos comentadores da imprensa ocidental, não assinalam a razão mais importante do falhanço do cessar-fogo de seis meses, que durou de 19 de Junho até 19 de Dezembro. Como nos confirmou Khaled Mechaal, chefe da comissão política do Hamas na semana passada, o acordo compreendia, para além do cessar-fogo, o levantamento do bloqueio de Gaza e um compromisso do Egipto em abrir a passagem de Rafah. Ora, não só Israel violou o acordo de cessar-fogo lançando um ataque que matou várias pessoas no dia 4 de Novembro, como os pontos de passagem não foram reabertos senão parcialmente, e o bloqueio foi mesmo reforçado nas últimas semanas. A população, que era largamente favorável ao acordo em Junho, exige hoje uma clarificação: ou a guerra ou a abertura incondicional dos pontos de passagem e o fim da chantagem permanente que permite a Israel matar lentamente à fome (e privar de cuidados de saúde) a população. Esta está certa quando acusa Israel, como relata o sítio Internet da Al-Jazeera em inglês: «Gazans: Israel violated the truce» (Mohammed Ali).

O presidente Nicolas Sarkozy reagiu com um comunicado. «O presidente da República exprime a sua mais viva preocupação perante a escalada da violência no Sul de Israel e na Faixa de Gaza. Condena firmemente as provocações irresponsáveis que conduziram a esta situação, assim como o uso desproporcionado da força. O presidente da República deplora as importantes perdas civis e exprime as suas condolências às vítimas inocentes e às suas famílias. Pede a paragem imediata dos lançamentos de mísseis sobre Israel, assim como dos bombardeamentos israelitas sobre Gaza, e apela à moderação de ambas as partes. Lembra que não existe solução militar em Gaza e pede a instauração de uma trégua duradoura.»

Num comunicado publicado na sequência do seu encontro com Abul Gheit, ministro egípcio dos Negócios Estrangeiros, Bernard Kouchner reiterou as mesmas posições, acrescentando todavia que a França pedia «a reabertura dos pontos de passagem», um ponto ignorado por Sarkozy.

A senadora Nathalie Goulet, da UMP (União para um Movimento Popular), pertencente à Comissão dos Negócios Estrangeiros, publicou a declaração seguinte: «Como sempre, Israel faz um uso excessivo da força perante a indiferença da comunidade internacional, que deixa degradar-se a situação em Gaza há meses e meses. Não há que culpar nem o Irão nem o Hamas, mas a inércia da comunidade internacional, o apoio sistemático da política americana a Israel e a intolerável “atitude dupla” das organizações internacionais. Israel viola desde há quarenta anos dezenas de resoluções da ONU, sem embargo, sem sanções e com toda a impunidade. A situação é insuportável para os habitantes civis de Gaza desde há anos. A situação tem vindo a degradar-se, com o seu cortejo de humilhações e uma sede de vingança. Olho por olho tornará o mundo cego, disse Gandi. Há já demasiado, demasiado tempo que estamos cegos e surdos em relação ao sofrimento do povo palestiniano.»

Os ataques também suscitaram as condenações habituais dos países árabes. Uma reunião de emergência da Liga Árabe terá tido lugar no domingo. O Egipto declarou que acusava Israel como responsável; esta afirmação é talvez uma resposta a informações da imprensa israelita que afirmam que o Cairo teria dado luz verde a uma operação limitada a Gaza visando derrubar o Hamas («Report: Egypt won’t object to short IDF offensive in Gaza», por Avi Issacharoff, Haaretz, 25 de Dezembro). Um outro artigo do Haaretz publicado no dia 28 de Dezembro, e que descreve a campanha de desinformação do governo israelita antes da ofensiva de Gaza, explica que Tzipi Livni, a ministra dos Negócios Estrangeiros, tinha informado o presidente Mubarak do ataque («Disinformation, secrecy and lies: How the Gaza offensive came about», por Barak Ravid). A cumplicidade do Cairo é confirmada por um relatório da Y-net, «Egypt lays blame on Hamas», por Yitzhak Benhorin (27 de Dezembro), que retoma as declarações do ministro egípcio dos Negócios Estrangeiros Abul Gheit, explicando que o seu governo tinha prevenido o Hamas e que os que não tinham escutado estes avisos assumiam a responsabilidade da situação (sobre as razões da política egípcia, ler esta entrevista com Khaled Mechaal).

Nestas condições, é duvidoso que estas condenações árabes conduzam a resultados. A única iniciativa espectacular e eficaz que o Cairo poderia tomar seria reabrir a ponte de passagem de Rafah, o que não quer fazer de modo nenhum – até agora, limitou-se a abrir a passagem aos feridos palestinianos. E, de acordo com a agência de imprensa Maan, nenhum ferido se apresentou, afirmando os médicos palestinianos que o transporte dos feridos graves é impossível, a menos que o Egipto envie helicópteros («Not one Gazan at Rafah crossing despite Egyptian promise to treat wounded, country to send medical supplies instead», 27 de Dezembro).

Para lá do bloqueio, é necessário lembrar que:

• a recusa da comunidade internacional em reconhecer o resultado das eleições legislativas de Janeiro de 2006, que deram a vitória aos candidatos do Hamas, contribuiu para a escalada israelita; assim como a recusa de admitir realmente o acordo de Meca entre a Fatah e o Hamas;

• a União Europeia e a França em particular, quaisquer que sejam a suas tomadas de posição, encorajam concretamente a política israelita, designadamente recompensando Israel pela melhoria das relações entre Israel e a União Europeia, apesar das violações repetidas por Israel de todos os compromissos (diminuição do número de check-points, desmantelamento dos colonatos «ilegais», etc.);

• finalmente, lembremos esta verdade, cuja evidência é demasiadas vezes ocultada: a Cisjordânia, Gaza e Jerusalém Oriental estão ocupadas desde há mais de quarenta anos. É esta ocupação que é a fonte de toda a violência no Médio Oriente.

[1] «Leftist Meretz issues rare call for military action against Hamas», por Roni Singer-Heruti, Haaretz, 25 de Dezembro.


(fonte: Le Monde Diplomatique, por Alan Gresh)

terça-feira, dezembro 23, 2008


Porque por estes dias será Natal, há coisas que
não se devem esconder.
O amor, a amizade, o carinho que nos une
e a vida que respiramos todos os dias!

A todos um NATAL MUITO FELIZ E UM ANO
DE 2009 RECHEADO DE BONS SONHOS!




domingo, dezembro 14, 2008

Consulta-se.
O homem, à luz do dicionário, cumpre-se como um exercício matemático. De palavras somadas, adjectivos subtraídos e desejos divididos em múltiplas interjeições.

A ele agradava-lhe esta leitura alfanumérica. Subtrai o remorso na hora de premir o gatilho.


(foto: Villagarcia de Arousa, 26.10.2008)

segunda-feira, outubro 27, 2008






Finis terrae. 25/10/2008
Há viagens com fim.
O Cabo Finisterra recebe-nos assim. Despido de artifícios, com o sol em debandada e os urros do mar. Há sensações difíceis de explicar. Quase como que um reencontro com tudo aquilo que vamos dissimulando no correr dos dias. Finge-se amar, inventa-se o ser amado, sorri-se a age-se pela circunstância. Tantas vezes nos esquecemos de nós, que o impacto atroz da eminência do fim causa estragos.

O extremo da península alberga o "fim do caminho" para peregrinos intempestivos. A mim soube-me a início. Povoado por lendas e crenças, mais ou menos mágicas, o Cabo Finisterra vive do confronto com a natureza, do horror primitivo da fúria das ondas, do renascer.

O vento cortante que atravessava o final de tarde, o percurso sinuoso e o cair da noite pareciam não convidar a uma visita ao extremo da península. O que será o fim do caminho para os peregrinos de Santiago mostrou-se como uma descoberta, quase que primordial. Há vida ali, num sítio apelidado de Costa da Morte. Não existem artifícios. Sol, terra, pedra dura, o desejo impresso no bater das ondas e duas mãos que se unem. De repente tudo o resto parece nada. A vida encontra-se aqui, precisamente no ponto de chegada.

Há movimentos que reaprendi ali, na vida que roubei ao fim do mundo. O rugido do mar nunca se esquece, a cor do sol continua a aquecer-me nestes dias de chuva. Há caminhadas que se fazem ao contrário. O fim preencheu-me com algo que terá mais a ver com a magia do início, do estremecer do primeiro toque.
Estranhamente, fui ao fim do mundo buscar aquilo que me foge todos os dias aqui, bem no centro do meu mundo e das minhas tão frágeis certezas.

segunda-feira, outubro 20, 2008

Pedro e o lago


Os dias de sol regressam envoltos em mistério. Há sol, há vontade de viver. Passeio-me pelas ruas quentes e queria voltar a abraçar-te. Pareces-me cada vez mais distante. O sol aquece-me, deixo uma pequena fábula para partilhar com os raios imaginados a amarelo vivo ou, simplesmente, com uns quaisqueres dias de chuva trémula.

Pedro caiu a um belo lago. Era uma manhã de sol, ouviam-se os pássaros, perscrutavam-se suaves movimentos de Primavera. A beleza da paisagem parecia intocável, a noite caiu e Pedro ficou só. Chorou sem parar, ninguém parecia ouvi-lo. Com os pés enregelados, Pedro sentiu o aconchego dos nenúfares e a neblina da noite dissipou-se para o aquecer.
Com a chegada da manhã, surgiu um novo mundo, onde a solidão deu lugar à descoberta. Pedro percorreu o terreno que circundava o belo lago. As árvores erguiam-se sumptuosas, enquanto as flores ostentavam um manancial de cores ousado. Os pequenos animais viviam livres. Pedro era um bicho estranho, inadaptado à sua condição natural. Os pés resfriavam com o orvalho da manhã. Ao lado do canteiro de begónias, um sapato repousava abandonado. Pedro imaginou um aventureiro lendário, percorrendo os locais mais inóspitos, e que ali deixara uma bota numa correria apressada rumo ao desconhecido. Os dedos descobriram espaço no interior do calçado, o seu corpo sentiu o apelo do amparo. Andarilhou durante toda a manhã. Viu sapos, rãs, gaivotas de partida para o mar e andorinhas de regresso à Primavera.
A passagem do meio-dia sobreaqueceu o ambiente. Uma qualquer bacia abandonada ao largo da água foi o suficiente para Pedro regressar ao imaginário da cidade, onde os homens se moviam maquinalmente, ao ritmo dos chapéus que os coroavam. O pequeno homem do lago usava bota e chapéu em forma de coco, apresentava a civilização às coisas da Natureza. O lago tornou-se a sua casa, as flores o seu manto nocturno, os pequenos animais a sua longa e terna companhia. Passaram dias, anos, passou tempo demais. Pedro ergue-se como uma árvore situada na margem esquerda do lago. Uma espécie estranha, de raízes humanas e copa de cavalheiro escocês.

(foto em www
.drewsart.co.uk, Isolation Series, Empty - I have no more to give...)

sexta-feira, agosto 22, 2008

Na serra justa


A história recriada em Valongo. De 'vallis longus' às lutas liberais, sem esquecer o minério que derramou tanto sangue pela serra. Há música, trombetas, há uma história de amor (como sempre, aliás) e uma hora de espectáculo garantido.

Fica o convite*








28.08.2008




SERRA JUSTA


Autor: Júnior Sampaio











Sinopse








Assente na história de Valongo, este espectáculo desenvolve um conceito de dramaturgia com base em factos históricos, antropológicos e na riqueza etnográfica do Conselho, em torno da descoberta e povoação do vale, dos diversos povos que por aqui passaram e dos ricos minérios aqui existentes.








Observações








Espectáculo para todas as idades
Informações e aquisição prévia de bilhetes: 22 4211565 / 96 4751300
Bilhetes Aquisição Prévia
2€ ENTREtanto AMIGO
3.5€ Público Geral
Bilhetes Adquiridos no local do Espectáculo
3€ ENTREtanto AMIGO
5€ Público Geral

Organização: ENTREtanto TEATRO e Câmara Municipal de Valongo






Elenco








Hugo Sousa, Sandra Santos e Grupos de Teatro Amador do Conselho de Valongo e alunos dos cursos orientados pelo ENTREtanto TEATRO








Local








Parque de Santa Justa





Técnica








Produção









ENTREtanto TEATRO





Produção Executiva









Amélia Carrapito e Sofia Leal





Figurinos









José Rosa





Desenho de Luaz









Wilma Moutinho





Operador de Luz









Helder Simões





Música









Monolab





Assistência de Encenação









Hugo Sousa





Texto, Encenação e Espaço Cénico









Júnior Sampaio







Outras Datas












29.08.2008 21h45



Parque de Santa Justa













30.08.2008 21h45



Parque de santa justa













31.08.2008 21h45



Parque de santa Justa











segunda-feira, agosto 18, 2008

Roteiro precisa-se!!!






De regresso fica a recordação do mar, do som das gaivotas na noite, do zurzido do motor da traineira. Ficam para trás passos de dança, ondas de caracol, fica a noite, as nuvens. Ficas tu.

De volta à rotina numa cidade despida hoje prevalecem os sonhos. Numa rua nua do movimento que se exigiria à hora de almoço, observam-se uns quantos forasteiros e algumas almas desencontradas. Não serei nenhum deles, pelo menos hoje não me sinto como algo de semelhante. Vejo-me expectante. O sol tem este estranho efeito de aclarar os cabelos (re)pintados, mas de esclarecer pouca coisa. Fica os laivos de loiro inusitados, sobram questões mais negras.

Não acredito em fugas, mas sim em novas oportunidades. Que todos temos direito ao sonho, à reivindicação, ao amor e à vida. Sentada numa esplanada à hora de almoço reflecte-se e contesta-se muita coisa. Fazem-se previsões, apontam-se caminhos. Há tanta coisa que poderia ter sido.

Hoje foi só o sol que me aqueceu o corpo. Surge-me tantas vezes o desejo da fuga, da partida. Custa-me tanto o dizer adeus.

Das férias regressa-se sempre, na vida muitas vezes passamos sem lhe sentir o cheiro. Exigem-se roteiros para viver!

P.S.: Fica a ilha da Berlenga para acompanhar