domingo, março 11, 2007

Quando era criança a primavera chegava assim...no cheiro!
Sentia o cheiro das flores logo pela manhã, a pele parecia mentol e o sol demorava-se pelas tardes. Escutavamos o cantar dos grilos a entrar pela janela do quarto, o vento morno a cobrir as brincadeiras e o céu azul a estender-se pelo horizonte, quando nos deitávamos com as costas na relva.
As flores eram as primeiras a ser notadas...muitas...até se perder de vista. Depois chegavam as joaninhas, com as suas capas vermelhas de bolinhas negras a percorrer os dedos para depois fugir, voando sem destino.
Realizavamos autênticas maratonas de bicicleta até ao rio, esquecendo sempre que o caminho de volta tinha que ser feito.
A mãe deixava-me andar descalça na relva, na terra, nas pedras quentes da eira...molhavamos os pés quando ela regava o jardim e corríamos atrás das borboletas que nasciam de um dia para o outro, tal como a Primavera.

Na sexta-feira ela chegou assim...não havia a eira, a mãe, os pés molhados, as costas deitadas na relva, mas ela chegou assim! Eu não sou criança mas a Primavera chegou.
Acordei para ir trabalhar, ouvi uma chefe recém licenciada na sua total ignorância, pequenina em sensatez proferir aguçadamente palavras de descontentamento, vi um homem chorar e uma colega a manifestar os seus dotes de comunicação. Vi um mundo que não cabia na minha infância e senti um coração pequenino na primavera que chegava.
Mas...
Veio a tarde...o rio outra vez...amava na Primavera. Talvez a primeira vez!
Veio o sábado e a praia...a alegria de partilhar a Primavera e de molhar os pés na areia e fazer palhaçadas.
Veio o Domingo...a mãe...o pai...as mãos da mãe...o amor da minha mãe...o braço forte do meu pai a segurar-me as quedas (já não tão forte agora)...as flores sem fim, a relva nas costas e o céu azul como única imagem.
Amanhã, independentemente de tudo, o "sol estará em cada sílaba"...E EU VOU AMAR...simplesmente porque mereço! Porque não sei como virá o futuro e o presente é o único tempo que tenho para viver e para amar, sem ter que me sentir culpada por isso!


Ana Marta Fortuna
Fotografia de Petrova

4 comentários:

Mariana disse...

A Primavera tem esta beleza de nos despertar os sentidos e aquecer a pele. Para lá das desistências e das desilusões do dia-a-dia, há sol, flores e haverá sempre a espuma do mar a bailar por entre os dedos dos pés. A beleza existe e é, por essa mesma razão, que não podemos permitir que o negro da rotina, dos dias passados sentados e sem chama nos mate. Pelo menos que seja uma morte clamorosa e não o lento passar dos dias.

Não te deixes arrastar pelas ideias feitas porque isso é desistir um pouco de ti todos os dias.

Beijos*

Anónimo disse...

No dia que se transforma, na vida que se acumula, nos anos que não voltam atrás há um sem fim de regras com que trabalhamos, que são necessárias para a nossa sobrevivência...Quando este dia acaba...o dia das regras, das máscaras, do cuidado é bom encontrar amigos que não tenham ideias feitas sobre nós.
É um mundo de merda...mas só conhecendo os seus podres é possível combater.
Quem me sabe pessoa (ou pelo menos quem parece que me sabe pessoa) sabe o quanto eu luto todos os dias...mas as minhas armas são parcas e muitos são os gigantes que me rodeiam...no fim do dia, sou só uma miuda, bem pequenina à espera de um conforto, alguém que entenda que sou uma lutadora num mundo de ideias feitas.

Ana Marta Fortuna

Mariana disse...

É por seres uma lutadora que não compreendo a tua resignação e a tua mágoa. Ninguém te critica pelo simples facto de questionar. Fica então com as tuas certezas.

Anónimo disse...

???
resignação??queres que faça o quê?que desate aos tiros porque não me convidam para o cargo?Vamos falar a sério de resignação???!!!

Mágoa?Só se for por não estares presente numa altura tão importante para mim...

Criticas por questionar??!!...certezas???!!

Escapa-me muita coisa!Quando quiseres falar avisa-me, que isto não é lugar.
Obrigada!
beijos.

ana marta fortuna